É muito comum ouvirmos a palavra
"ancoragem" em trabalhos espirituais, orações, e ritualísticas
associadas a inúmeros sistemas mágicos. O verdadeiro significado em esoterismo
muitas vezes, porém, tem sido desfigurado através dos anos e do advento de
muitas ideias fantasiosas surgidas a partir da má interpretação de profundos
conceitos teosóficos.
Sem deixar de lado a grandeza da
Teosofia, o entendimento da ancoragem psíquica e espiritual deve seguir os
simples caminhos de sua própria etimologia.
Ancorar é a ação de se lançar uma ou
várias âncoras, artefato pontiagudo de considerável peso que, unido a cordas ou
correntes, eram lançadas ao mar para que as naus se estabilizassem em
determinado ponto, afim de que não defletissem ao sabor das correntes marítimas.
O navio ancorado estava posicionado em
uma localização desejável. Estabilizado dentro dos padrões necessários para que
fossem cumpridas as tarefas específicas à sua função mercantil, ou mesmo
bélicas.
Baseado na correspondência do efeito da
ancoragem em sua aplicação náutica poderia perguntar: Qual a maior
"ancoragem" para o espírito humano?
Um sensato estudante de qualquer escola
esotérica certamente iria me responder: "a Fé".
E sua resposta estaria correta. Mais
correta impossível.
"Porque em verdade vos digo que, se
tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para
acolá, e há de passar; e nada vos será impossível”. —Disse Jesus.
Quantas pessoas conhecemos que conseguem
movimentar uma montanha, ou mesmo um simples pedregulho com o poder de
"sua fé"?
Contudo está frase, transcrita do
Evangelho Canônico de Matheus, está longe de ser uma quimera, uma metáfora ou
mesmo uma alegoria bíblica.
Se acreditamos que existe Deus, e este
se faz onipresente, e está dentro de nós
representado pela centelha divina, existe este poder latente intrínseco ao
nosso ser.
Esta frase está longe de ser uma
mentira, e talvez a maior verdade do grande mistério do universo.
Há, dentro de nós, o poder divino, ou
seja, a própria divindade. "Não sabeis vós que sois santuário de Deus, e
que o Espírito de Deus habita em vós?"—Disse Paulo em sua primeira carta
aos coríntios.
Existe, portanto, todo o poder inerente
ao nosso ser, e este poder é acionado pela fé. A fé que não temos e que não
alcançamos pela própria condição humana, atrelada ao ego, e toda sua ignorância
em relação à verdadeira realidade, suplantada pelo mundo das ilusões.
Não possuímos, portanto, a mais perfeita
ancoragem para fazermos uso do poder divino dentro de nós.
Desprovido da fé o ser humano buscou o
poder espiritual através de diversas ancoragens que fortalecessem seu rudimento
de fé. São essas ancoragens que conhecemos, e que usamos como um recurso, ainda
que precário, para alcançarmos o domínio da Espiritualidade. Não falo domínio
das forças espirituais, mas o nosso domínio interior capaz de canalizar e
direcionar as energias que sempre estiveram à nossa disposição.
...Mas quais são essas ancoragens que
fortalecessem nossos rudimentos de fé?
Vamos começar falando da magia, dos
rituais, de todas as estruturações que estabelecem um sistema mágico, com seus
sigilos, símbolos e indumentárias.
Toda simbologia e ritualística
potencializa a fé para que sejam alcançadas as canalizações que conferem o
poder aos inúmeros e variados sistemas.
São necessárias todas as prescrições
para a eficácia da canalização?
Para o homem comum, sim. Para o homem que
possui um grau mais elevado no conhecimento de seu próprio poder inerente, não.
Esse poder se chama fé, e é mais forte que qualquer ritual de qualquer sistema
ou de qualquer civilização.
Mas e as magias poderosas existem?
Certamente. Pois representam o próprio
rudimento de fé potencializado em diferentes níveis em conformidade com o
amadurecimento espiritual de cada ser.
Ritualísticas, símbolos, orações e todos
os caminhos que o ser humano desembaraça na concepção de Deus, são as
ancoragens. Não podemos esquecer o detalhe que Deus está dentro de nós,
imanente e não transcende como muitos acreditam ser.
A ancoragem é tão psíquica quanto
espiritual, pois a fé é a essência da espiritualidade, e, para que seja
potencializada, é necessário que utilizemos as ferramentas psíquicas, as únicas
capazes de descortinar a virtude de "crer". Essas ferramentas são os
graus de consciência, cuja elevação suplanta a dúvida, a grande pedra de
tropeço para a auto-realização.
Existem relíquias milagrosas em quase
todas as religiões do mundo. Muitas delas extremamente poderosas com histórico
de milagres inexplicáveis à ciência oficial.
Mas vejamos: uma relíquia cristã não tem
valor algum para um budista, e, consequentemente não terá também poder algum.
Do mesmo modo, poderosos símbolos da alta magia Cabalística não terá poder
algum para um cristão, especialmente se, para este é um símbolo negativo em seu
conjunto de crenças.
Cada símbolo, relíquia, imagem, possui
poder dentro de seu próprio aspecto de crença. Dessa maneira é simples concluir
que são "potencializadores" da fé de cada um. O poder está na fé e
não na relíquia em si. São todos, pois,
ancoragens, instrumentos para a realização do poder divino dentro de cada ser.
Essa é a fé que remove montanhas e que,
infelizmente, necessita de "pontes" para suprir nossa condição humana
impregnada de dúvidas e incertezas.
A oração talvez seja a mais acessível
das ancoragens, e muitas vezes mais forte que ritualísticas de inúmeros
sistemas mágicos. Tudo dependerá da maturidade espiritual, da capacidade de
crer no grande poder intrínseco da centelha divina.
Lembremos: Pedro andou sobre as águas.
Fez isso pelo poder de Jesus? Claro que não. Pois quando teve medo caiu sobre o
mar agitado. E caiu justamente porque temeu, esvaindo seu próprio poder cuja
ancoragem era a imagem de seu Mestre.
Os "decretos", tão
beneficamente utilizados, sempre citam na doxologia a própria ancoragem. Mas os
decretos são por si só, fortes ancoragens, assim como as orações quânticas.
Todos dependem da fé que, embora fraca,
pode se tornar forte, potencializada com a ancoragem compatível com a crença.
“Senhor, eu não sou digno de que entreis
em minha casa. Dizei uma só palavra e meu servo será curado”—Disse o centurião
de Cafarnaum.
Sim. Uma só palavra, ancorada na
verdadeira fé, transforma mundos e recria universos, pois dispensa dogmas,
doutrinas, preceitos ou ritualísticas. É a ancoragem na certeza. Certeza de
nossa natureza divina, a espera de um
novo nascimento.
Namastê
OM TAT SAT